O que ele queria mesmo era fazer peças de teatro sobre peças de fruta.

4.9.09

Tentativa #6

Olá.
Eu disse olá.
A coisa é a seguinte: como de costume comecei a bater à máquina sem ideia nenhuma sobre nada. Como de costume é mais uma dorzinha no estômago do que uma ideia, e as ideias dão dorzinhas noutros lados, por exemplo na língua e na testa, não uma dorzinha no estômago. Posso chamar a esta dorzinha no estômago (porque uso diminutivo, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não usam diminutivos, nada é susceptível de ser encolhido para eles, nada é apoucável, compactável - ao contrário do suecos, que inventaram os picles e o ikea) esta dor no estômago, dizia, posso chamá-la
BORBOLETA
porque não gosto de sensação, muito menos de sentimento (que são coisas diferentes, disseram-me) e não encontro outra palavra que não
BORBOLETA



assim escrita, sem minúsculas nem diminutivos, não é erro do processador de texto (as máquinas de escrever não tinham corrector automático e a malta sobrevivia, pelo menos a malta que não era atropelada por autocarros). Dizia, foi sem ideias mas com borboletas que sem querer comecei a vomitar, de modo que desta vez, porque é a enésima vez que tal acontece - não me lembro sequer de alguma vez ter tido alguma ideia, não acredito em lâmpadas incandescentes no cocuruto (embora gostasse de acreditar), não porque tenha sucumbido à ditadura verde das lâmpadas amigas do ambiente (porque é que me lembrei outra vez do ikea, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não se lembram outra vez do ikea porque estão ocupados a andar de bicicleta e a comer sandes de batata e arenque, porque é que me lembrei outra vez do ikea, às vezes o homenzinho violeta que guardamos na vesícula e que pensa por nós consegue ser bastante estúpido, tão redundantemente circular)
BORBOLETA (diz-se bolboreta em galego, fixe não?)
não por isso, mas porque as ideias, ao contrário das borboletas, levam mais do que uma gestação a nascer, muito mais do que uma geração a morrer, infinitamente mais do que as lâmpadas amigas dos animais a acender, pegar fogo e fundir.



Desta vez, dizia, em consequência das borboletas e da mobília compactável que tentava explicar, ia começar um exercício que me parecia muito divertido e que consistia em escrever à velocidade do cérebro, não!, à velocidade do homenzinho violeta que guardamos na vesícula - não! - à velocidade do bater de asas da
BORBOLETA
mas vou ter de parar por aqui porque fico com as mãos dormentes quando me rio e um francês gordo sentou-se à minha frente e está com o rabo todo à mostra. É um rabo com muitos pêlos e muita piada.

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