Amanhã, lembrar de desentranhar o meu crescimento das vossas paredes.
O filho e a guitarra
O que ele queria mesmo era fazer peças de teatro sobre peças de fruta.
18.6.10
25.5.10
tá ligado?
E se todos, sem excepção
fôssemos como não? Seis cordas
mais duas na garganta
ossos e um peito
infindo.
Mas agora vieram-me à cabeça as palavras
comissão
parlamentar
de inquérito
ao negócio
pt
tvi.
Isto não é um poema,
são translineações
imbecis.
tá ligado?
16.3.10
4.3.10
Quando o que ele queria mesmo era ser chef de cozinha
- Muito gostas tu das vozes sobrepostas.
- Pá, isto das canções é como cozinhar,
três cebolas, dois dentes de alho, azeite, vinho branco
- ou se sabe a receita ou se inventa. Com muito picante e cominhos e paprica. E deixa-se refogar mais do que o tempo necessário para caramelizar, o lume ligado para lá do que é preciso para apurar. As vozinhas e o barulhinhos são a minha paprica.
- Eu gosto de paprica!
- Ainda bem.
28.2.10
23.2.10
Queria que vissem o que acontece dentro de nós quando cantamos,
disse à Pública desta semana. É a Lula Pena e vai voltar. Abram alas.
5.10.09
Hoje choveu-nos e até amanhã
And I will stroll the merry way and jump the hedges first, and I will drink the clear clean water for to quench my thirst, and I shall watch the ferry-boats and they'll get high on a bluer ocean against tomorrows sky, and I will never grow so old again, and I will walk and talk in gardens all wet with rain, oh sweet thing, my sweet thing. And I shall drive my chariot down your streets and cry, hey, it's me, I'm dynamite and I don't know why, and you shall take me strongly in your arms again, and I will not remember that I ever felt the pain, we shall walk and talk in gardens all misty wet with rain, and I will never, never grow so old again, oh sweet thing, my sweet thing. And I will raise my hand up into the night time sky and count the stars that's shining in your eye, just to dig it all and not to wonder, that's just fine, and I'll be satisfied not to read in between the lines, and I will walk and talk in gardens all wet with rain. And I will never ever grow so old again. Oh sweet thing, my sweet thing, with your champagne eyes and your saint-like smile.
8.9.09
4.9.09
Tentativa #6
Olá.
Eu disse olá.
A coisa é a seguinte: como de costume comecei a bater à máquina sem ideia nenhuma sobre nada. Como de costume é mais uma dorzinha no estômago do que uma ideia, e as ideias dão dorzinhas noutros lados, por exemplo na língua e na testa, não uma dorzinha no estômago. Posso chamar a esta dorzinha no estômago (porque uso diminutivo, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não usam diminutivos, nada é susceptível de ser encolhido para eles, nada é apoucável, compactável - ao contrário do suecos, que inventaram os picles e o ikea) esta dor no estômago, dizia, posso chamá-la
BORBOLETA
porque não gosto de sensação, muito menos de sentimento (que são coisas diferentes, disseram-me) e não encontro outra palavra que não
BORBOLETA
assim escrita, sem minúsculas nem diminutivos, não é erro do processador de texto (as máquinas de escrever não tinham corrector automático e a malta sobrevivia, pelo menos a malta que não era atropelada por autocarros). Dizia, foi sem ideias mas com borboletas que sem querer comecei a vomitar, de modo que desta vez, porque é a enésima vez que tal acontece - não me lembro sequer de alguma vez ter tido alguma ideia, não acredito em lâmpadas incandescentes no cocuruto (embora gostasse de acreditar), não porque tenha sucumbido à ditadura verde das lâmpadas amigas do ambiente (porque é que me lembrei outra vez do ikea, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não se lembram outra vez do ikea porque estão ocupados a andar de bicicleta e a comer sandes de batata e arenque, porque é que me lembrei outra vez do ikea, às vezes o homenzinho violeta que guardamos na vesícula e que pensa por nós consegue ser bastante estúpido, tão redundantemente circular)
BORBOLETA (diz-se bolboreta em galego, fixe não?)
não por isso, mas porque as ideias, ao contrário das borboletas, levam mais do que uma gestação a nascer, muito mais do que uma geração a morrer, infinitamente mais do que as lâmpadas amigas dos animais a acender, pegar fogo e fundir.
Desta vez, dizia, em consequência das borboletas e da mobília compactável que tentava explicar, ia começar um exercício que me parecia muito divertido e que consistia em escrever à velocidade do cérebro, não!, à velocidade do homenzinho violeta que guardamos na vesícula - não! - à velocidade do bater de asas da
BORBOLETA
Eu disse olá.
A coisa é a seguinte: como de costume comecei a bater à máquina sem ideia nenhuma sobre nada. Como de costume é mais uma dorzinha no estômago do que uma ideia, e as ideias dão dorzinhas noutros lados, por exemplo na língua e na testa, não uma dorzinha no estômago. Posso chamar a esta dorzinha no estômago (porque uso diminutivo, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não usam diminutivos, nada é susceptível de ser encolhido para eles, nada é apoucável, compactável - ao contrário do suecos, que inventaram os picles e o ikea) esta dor no estômago, dizia, posso chamá-la
BORBOLETA
porque não gosto de sensação, muito menos de sentimento (que são coisas diferentes, disseram-me) e não encontro outra palavra que não
BORBOLETA
assim escrita, sem minúsculas nem diminutivos, não é erro do processador de texto (as máquinas de escrever não tinham corrector automático e a malta sobrevivia, pelo menos a malta que não era atropelada por autocarros). Dizia, foi sem ideias mas com borboletas que sem querer comecei a vomitar, de modo que desta vez, porque é a enésima vez que tal acontece - não me lembro sequer de alguma vez ter tido alguma ideia, não acredito em lâmpadas incandescentes no cocuruto (embora gostasse de acreditar), não porque tenha sucumbido à ditadura verde das lâmpadas amigas do ambiente (porque é que me lembrei outra vez do ikea, pergunto-me, e perguntar-me-ia o meu tio também, que é dinamarquês, e os dinamarqueses não se lembram outra vez do ikea porque estão ocupados a andar de bicicleta e a comer sandes de batata e arenque, porque é que me lembrei outra vez do ikea, às vezes o homenzinho violeta que guardamos na vesícula e que pensa por nós consegue ser bastante estúpido, tão redundantemente circular)
BORBOLETA (diz-se bolboreta em galego, fixe não?)
não por isso, mas porque as ideias, ao contrário das borboletas, levam mais do que uma gestação a nascer, muito mais do que uma geração a morrer, infinitamente mais do que as lâmpadas amigas dos animais a acender, pegar fogo e fundir.
Desta vez, dizia, em consequência das borboletas e da mobília compactável que tentava explicar, ia começar um exercício que me parecia muito divertido e que consistia em escrever à velocidade do cérebro, não!, à velocidade do homenzinho violeta que guardamos na vesícula - não! - à velocidade do bater de asas da
BORBOLETA
mas vou ter de parar por aqui porque fico com as mãos dormentes quando me rio e um francês gordo sentou-se à minha frente e está com o rabo todo à mostra. É um rabo com muitos pêlos e muita piada.
3.9.09
Tentativa #2
Para escrever, dá-me a ideia, é preciso ter alguma ideia sobre alguma coisa, não me sente escrever este martelar, martelar é duro mas não é escrever, martelar é útil logo não é escrever, martelarei eternamente nunca tendo ideia nenhuma sobre nada, sou um deserto de ideias, digo melhor um deserto sem ideias, mas até penso, aliás penso bastante, já pensei mais mas continuo a pensar com alguma assiduidade, penso às vezes demasiado, não sou ultrapensador mas penso que penso demasiado, isto é, é demasiado o que penso porque no que ganho pensando perco no resto, sendo o resto quem sabe o mais importante porque o motivo porque penso, penso às vezes demasiado, dizia, mas nunca me ocorreu pensar com uma pena na mão e um papel na mesa, o que é uma pena, é realmente uma pena porque se pensar é demais não é demais escrever, mas publicar é outra estória, publicar pode ser crime
art.º 25º-B, n.º 1, CP
Publicar tolices dá cadeia
não sou um tigre azul nem escrevo com duas mãos
(procurava há anos por esta frase)
não sou um tigre azul nem escrevo com duas mãos quando o que quero dizer é que não há nada de especial em mim, reparem que dou um jeitinho à palavrinhas encaixadinhas algures entre a cozinha amarela e a praia, palavrinhas como cabulazinhas escondidinhas algures entre a epígrafe e a estatuição
art.º 25º-B, n.º 1, CP
imbecilidades (16º, 2), vacuidades (23º), disparates (24º), soberba (25º-A)
Publicar tolices dá cadeia
um jeitinho às palavras que é um capricho da forma, um primado da estética e um deserto de ideias. É uma pena, dizia, que não me ocorra pensar quando tenho uma pena na mão (como agora) e um papel na mesa (como agora, pois), ou de outra forma não me ocorra escrever quando estou a pensar, isto porque quando decido escrever já não estou a pensar, estou a desenroscar a tampa do tinteiro, já não estou a pensar, apenas a pensar que penso ou pensando que havia pouco pensara. De resto, ainda que com surpresa me achasse pensando e escrevendo ao mesmo tempo, dificilmente escreveria aquilo que pensaria. Com alguma sorte - e concentração?, nunca fui grande espingarda nesse particular, decorar regras de jogos, por exemplo, sempre se me revelou tarefa embaraçosamente complicada, sobretudo quando era ela que me as tentava explicar, sobretudo porque ela era bonita e tinha sinais no pescoço e eu distraía-me com isso, é muito mais divertido decorar os sinais do teu pescoço que as regras do teu jogo, nunca fui grande espingarda em concentração, de qualquer modo concentrar é afrouxar a latitude dos sentidos e descansar as palmas das mãos por uns minutos, é muito mais divertido decorar as regras do teu pescoço que os sinais do teu jogo - com alguma sorte (e concentração, então), dizia, escreveria não aquilo em que pensava mas sobre aquilo em que pensava. Mas aí entramos naquela história do coiso.
A história do coiso: a poesia é singularmente sedutora nesse aspecto, parece que é a forma mais imediata de fugir do coiso
(quando falo do coiso percebem-me?)
na poesia o coiso é menor, o coiso é mesmo pequenino. Explico-me a mim mesmo, desculpem-me se não tenho curso superior, o coiso: o espaço - o tempo? - entre o pensar e o escrever. Aliás, não é nada disso.
O coiso: o espaço e o tempo entre o sentir e o
Não não não
Não
É algo mais gutural,
experimenta:
agarra-te ao peito, isto é as garras no peito
as tuas garras no teu peito, cerra os dentes
range-os arrepia-te
abre os olhos
mais, um pouco mais
isso assim
sentes a bola feita de qualquer coisa a bola no peito
veio de baixo, agora na garganta
empurram-te também de cima, esmagam-te
amassam-te espremem-te a cabeça
a bola a sair do peito, podia sair da boca
a bola feita de luz e de merda
e de braços
abraça-te tu a ti mesmo com as garras
percebes que ainda não paraste de gritar
trazes as nuvens
o teu grito é o mais alto
o mais terrível o mais belo
cheio de luz e de merda e
vem de cima e de baixo e dos lados e
comprimido e é bola de tudo
a explodir, explodindo
len
ta
men
te
explosão lenta e surda
o olhos gritam não choram
és só peito, os braços aquecem-te o mundo
és só peito e choraste, não dos olhos, do peito
numa bola que sem querer mostraste
- ei-la
que é bola, já viste, de luz e de tudo
e Silêncio
o coiso. O coiso é também a coisa em si. E entre o coiso e o ser: o coiso deixa de ser (isto é, puf!), o coiso deixa de ser, e são só palavras, ou apertos de mão, ou erecções, ou sorrisos, ou murros no capô do carro. O coiso é também o espaço - o tempo? - em si mesmo entre o coiso e o ser.
Inevitavelmente (portanto deixemo-nos de merdas pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas deixemo-nos de merdas) inevitavelmente o coiso não deixará jamais de não ser.
HOMEM (abotoando a braguilha) Fiquemo-nos pelos apalpões querida, tenho os olhos cansados.
(Na verdade HOMEM está sem tusa porque a casa cheira a sopa)
HOMEM (acendendo um cigarro) De qualquer modo estás de diarreia.
(QUERIDA sai de cena)
o coiso. Procuras o coiso em toda a parte, em toda a parte o coiso faz todo o sentido - aquele grito de olhos - em todo o lado: trompetes, masturbação, álbuns de casamento, legumes, necrofilia,
(Nota: penetrar uma ovelhinha bebé morta em público é tão propositadamente pervertido que nem chega a ser patológico. É necropedofilia bestiovoyeurista. E é má ideia.)
o coiso. Procuramos. Mas o que te fode,
como quem fode a pequena ovelhinha, é que
o grito de olhos estranhamente pérfidos felizes viscerais
o peito de luz
cascata anti-gravitacional, planetas, tigre azul
escrever com duas mãos, cascata
de merda e de ideias
(para escrever, dá-me a ideia, é preciso ter alguma ideia sobre alguma coisa)
a bola de braços
em ti (portanto
no Universo)
o Silêncio que não existe
- explode surdo -
mas o que te fode é que
o coiso
provavelmente só morrendo.
Provavelmente morremos.
Enquanto isso tenho de comer qualquer coisa, faz-se tarde e tenho onde estar.
art.º 25º-B, n.º 1, CP
Publicar tolices dá cadeia
não sou um tigre azul nem escrevo com duas mãos
(procurava há anos por esta frase)
não sou um tigre azul nem escrevo com duas mãos quando o que quero dizer é que não há nada de especial em mim, reparem que dou um jeitinho à palavrinhas encaixadinhas algures entre a cozinha amarela e a praia, palavrinhas como cabulazinhas escondidinhas algures entre a epígrafe e a estatuição
art.º 25º-B, n.º 1, CP
imbecilidades (16º, 2), vacuidades (23º), disparates (24º), soberba (25º-A)
Publicar tolices dá cadeia
um jeitinho às palavras que é um capricho da forma, um primado da estética e um deserto de ideias. É uma pena, dizia, que não me ocorra pensar quando tenho uma pena na mão (como agora) e um papel na mesa (como agora, pois), ou de outra forma não me ocorra escrever quando estou a pensar, isto porque quando decido escrever já não estou a pensar, estou a desenroscar a tampa do tinteiro, já não estou a pensar, apenas a pensar que penso ou pensando que havia pouco pensara. De resto, ainda que com surpresa me achasse pensando e escrevendo ao mesmo tempo, dificilmente escreveria aquilo que pensaria. Com alguma sorte - e concentração?, nunca fui grande espingarda nesse particular, decorar regras de jogos, por exemplo, sempre se me revelou tarefa embaraçosamente complicada, sobretudo quando era ela que me as tentava explicar, sobretudo porque ela era bonita e tinha sinais no pescoço e eu distraía-me com isso, é muito mais divertido decorar os sinais do teu pescoço que as regras do teu jogo, nunca fui grande espingarda em concentração, de qualquer modo concentrar é afrouxar a latitude dos sentidos e descansar as palmas das mãos por uns minutos, é muito mais divertido decorar as regras do teu pescoço que os sinais do teu jogo - com alguma sorte (e concentração, então), dizia, escreveria não aquilo em que pensava mas sobre aquilo em que pensava. Mas aí entramos naquela história do coiso.
A história do coiso: a poesia é singularmente sedutora nesse aspecto, parece que é a forma mais imediata de fugir do coiso
(quando falo do coiso percebem-me?)
na poesia o coiso é menor, o coiso é mesmo pequenino. Explico-me a mim mesmo, desculpem-me se não tenho curso superior, o coiso: o espaço - o tempo? - entre o pensar e o escrever. Aliás, não é nada disso.
O coiso: o espaço e o tempo entre o sentir e o
Não não não
Não
É algo mais gutural,
experimenta:
agarra-te ao peito, isto é as garras no peito
as tuas garras no teu peito, cerra os dentes
range-os arrepia-te
abre os olhos
mais, um pouco mais
isso assim
sentes a bola feita de qualquer coisa a bola no peito
veio de baixo, agora na garganta
empurram-te também de cima, esmagam-te
amassam-te espremem-te a cabeça
a bola a sair do peito, podia sair da boca
a bola feita de luz e de merda
e de braços
abraça-te tu a ti mesmo com as garras
percebes que ainda não paraste de gritar
trazes as nuvens
o teu grito é o mais alto
o mais terrível o mais belo
cheio de luz e de merda e
vem de cima e de baixo e dos lados e
comprimido e é bola de tudo
a explodir, explodindo
len
ta
men
te
explosão lenta e surda
o olhos gritam não choram
és só peito, os braços aquecem-te o mundo
és só peito e choraste, não dos olhos, do peito
numa bola que sem querer mostraste
- ei-la
que é bola, já viste, de luz e de tudo
e Silêncio
o coiso. O coiso é também a coisa em si. E entre o coiso e o ser: o coiso deixa de ser (isto é, puf!), o coiso deixa de ser, e são só palavras, ou apertos de mão, ou erecções, ou sorrisos, ou murros no capô do carro. O coiso é também o espaço - o tempo? - em si mesmo entre o coiso e o ser.
Inevitavelmente (portanto deixemo-nos de merdas pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas e pessoas deixemo-nos de merdas) inevitavelmente o coiso não deixará jamais de não ser.
HOMEM (abotoando a braguilha) Fiquemo-nos pelos apalpões querida, tenho os olhos cansados.
(Na verdade HOMEM está sem tusa porque a casa cheira a sopa)
HOMEM (acendendo um cigarro) De qualquer modo estás de diarreia.
(QUERIDA sai de cena)
o coiso. Procuras o coiso em toda a parte, em toda a parte o coiso faz todo o sentido - aquele grito de olhos - em todo o lado: trompetes, masturbação, álbuns de casamento, legumes, necrofilia,
(Nota: penetrar uma ovelhinha bebé morta em público é tão propositadamente pervertido que nem chega a ser patológico. É necropedofilia bestiovoyeurista. E é má ideia.)
o coiso. Procuramos. Mas o que te fode,
como quem fode a pequena ovelhinha, é que
o grito de olhos estranhamente pérfidos felizes viscerais
o peito de luz
cascata anti-gravitacional, planetas, tigre azul
escrever com duas mãos, cascata
de merda e de ideias
(para escrever, dá-me a ideia, é preciso ter alguma ideia sobre alguma coisa)
a bola de braços
em ti (portanto
no Universo)
o Silêncio que não existe
- explode surdo -
mas o que te fode é que
o coiso
provavelmente só morrendo.
Provavelmente morremos.
Enquanto isso tenho de comer qualquer coisa, faz-se tarde e tenho onde estar.
6.6.09
5.6.09
Mata os teus ídolos
mas agarra o último bilhete de todos os seus concertos.
«Estive há dez minutos atrás na varanda do meu quinto andar a observar a cúpula invisível entre o céu e o enorme lego de betão e a sentir-me um inquilino passageiro desta pensão de duas estrelas perdida na imensa cidade negra a que damos o nome de universo. Curiosamente parece que é o único sítio que temos para passar a longa noite que nos espera. E é aí que eu saio para apanhar a frequência. No meu prisma, a encaixar, provavelmente no de outros feito um filósofo de merda. Mas a vida é isso mesmo, um monte de gente a fazer de conta que se entende e ninguém sabe dizer o que viveu. Por isso nos pedem que caminhemos alegres para o precipício sem questionar, porque estaremos sempre longe. Mas longe rapidamente fica perto e perto rapidamente passa por nós. Eu não quero mandar-te para baixo, mas eu sei que me entendes, tu também tens medo de morrer, toda a gente tem. Só que normalmente inventamos montes de problemas para nos convencermos que estamos ocupados a resolver uma situação importante quando não tem importância nenhuma. Entretanto o tapete rola e nós irritamo-nos com a inevitabilidade, e nos nossos sonhos dizemos
- Torna-me imortal! Torna-me imortal! Eu não vou aguentar deixar de existir.
e é aí que eu entro para sair da frequência, seduzir-te com os meus sonhos, tu não vês como empreendo? E como eu mais um milhão de sonhadores leva com ele muitos braços de outros, acéfalos, na lotaria dos ideais, descrentes, beijando o número do bilhete. Mas quero dizer-te que a viagem é tua, não quero empurrar-te à força para a rua. Se eu falhar vou passar de deus a carrasco, embalsamado e metido dentro dum frasco, para te lembrares da mentira, mas a verdade é que ganhamos sempre.»
«Estive há dez minutos atrás na varanda do meu quinto andar a observar a cúpula invisível entre o céu e o enorme lego de betão e a sentir-me um inquilino passageiro desta pensão de duas estrelas perdida na imensa cidade negra a que damos o nome de universo. Curiosamente parece que é o único sítio que temos para passar a longa noite que nos espera. E é aí que eu saio para apanhar a frequência. No meu prisma, a encaixar, provavelmente no de outros feito um filósofo de merda. Mas a vida é isso mesmo, um monte de gente a fazer de conta que se entende e ninguém sabe dizer o que viveu. Por isso nos pedem que caminhemos alegres para o precipício sem questionar, porque estaremos sempre longe. Mas longe rapidamente fica perto e perto rapidamente passa por nós. Eu não quero mandar-te para baixo, mas eu sei que me entendes, tu também tens medo de morrer, toda a gente tem. Só que normalmente inventamos montes de problemas para nos convencermos que estamos ocupados a resolver uma situação importante quando não tem importância nenhuma. Entretanto o tapete rola e nós irritamo-nos com a inevitabilidade, e nos nossos sonhos dizemos
- Torna-me imortal! Torna-me imortal! Eu não vou aguentar deixar de existir.
e é aí que eu entro para sair da frequência, seduzir-te com os meus sonhos, tu não vês como empreendo? E como eu mais um milhão de sonhadores leva com ele muitos braços de outros, acéfalos, na lotaria dos ideais, descrentes, beijando o número do bilhete. Mas quero dizer-te que a viagem é tua, não quero empurrar-te à força para a rua. Se eu falhar vou passar de deus a carrasco, embalsamado e metido dentro dum frasco, para te lembrares da mentira, mas a verdade é que ganhamos sempre.»
Ou «ele tem mau hálito, ela tem mau hálito também». Dia nove às nove e meia no São Jorge.
15.5.09
Fila de espera
Ontem devo ter-te dito que os melhores poemas são aqueles que começam por ser cartas: não é bem isso, ou não é só isso: as cartas começam poemas, fórmulas mais ou menos matemáticas de masturbação, de aquietação, de vingança, sabes, do que te servir na altura
- Ouve só, ficou porreiro
e porreiramente devolves o papel ao bolso esfregas as mãos
dás-me moedas para mais uma enrolas o que juras ser o último da noite
não, vão sem mim, já vos disse que prefiro ir a pé, aliás é a melhor parte da noite, que me interessam os assobios dos prostitutos as navalhas nas suas mãos os mercedes a abrandar? Soubessem eles que nem para sexo por dinheiro me recomendo aceleravam. Vou a pé. Como de outra maneira teria tempo para parar à frente de casa de todas as que amei e insultar-me e insultar-me e insultar-me com um ramo do meu cipreste num bolso e um laço das tuas cuecas no outro?
Um dia falei-vos de precipícios e combóios e janelas de terceiros andares. O que não sabem vocês é que no dia seguinte quis atirar-me da ponte sobre o Tejo
- Aha! Agora estão todos em pânico a achar que me vou matar
quis atirar-me da ponte sobre o Tejo
- agora a minha tia liga à minha mãe
atirar-me da ponte sobre o Tejo
- agora o meu pai liga à minha irmã
da ponte sobre o Tejo
- agora a minha irmã abraça-me, a minha mãe finge nada ser, antes a ponte sobre o Tejo que é aqui ao lado, põe o pijaminha e concentra-te
(a minha família ainda acha que sou o mais inteligente)
e no entanto quis atirar-me da ponte sobre o Tejo, sorrindo ver o rio aproximar-se devagarinho muito devagarinho os carros a apitar lá em cima olhar à minha volta: Lisboa é bonita, sempre gostei da vista da ponte à chegada mas do que gostava mais era que o meu pai fosse pela parte vermelha fazia um barulho que acordava a minha irmã eu punha a cabeça de fora da janela olhava para baixo e via verde o rio muita perto pai sentia-lhe o cheiro o vento secando os meus dentes de leite podres do antibiótico: agora tapar o nariz fechar os olhos,
estou quase a mergulhar
seguro o elástico do chapeuzinho
agarro-me aos três palhacinhos
o Matatinho o Tuetinhas a Tarolina,
eles choram de medo, eu canto.
Ontem vi um anjo na fila de espera das finanças, não percebi se estava ali para abrir actividade se para se fazer explodir. Não percebi se estava ali eu para adivinhar anjos na fila de espera se para arder o resto que de criança em mim repousa - mas para quê tirar bilhete se vamos já tarde demais para as apresentações e para a vida? Terei eu sido o único estúpido a ver Deus no reflexo do saxofone?
De elegias amorosas estamos também fartos, mas só por algumas horas: geralmente as que antecedem o momento em que nos levantamos
- Já venho
saímos de cima dela escorregamos
rolamos para a almofada mais fresca
o tempo necessário na cama para
um ou dois suspiros e a testa secar
o tempo necessário para não aleijar
- Bebé olha que assim me aleijas porra!
o tempo necessário para não dar motivos a ninguém para chorar
- Chora bebé porra
(nunca devias ter tido um filho)
Se não escrevêssemos seria porque não acreditaríamos que num só verso pode caber o
Universo
ou os Dedos dos Pés carentes do mongolóide do acordeão
que cravam convexos a palmilha tinjida das sandálias
o mongolóide curvado suado os ombros felizes
(qual quê, porque digo felizes?)
incompletos
carpindo canções que queríamos compreender.
Mãe?
Não me leves a sério
mas vem buscar-me cá abaixo.
- Ouve só, ficou porreiro
e porreiramente devolves o papel ao bolso esfregas as mãos
ão te disser nada até amanhã é porque morr
dás-me moedas para mais uma enrolas o que juras ser o último da noite
nguém te vai querer com olheiras
cheiras a lareira
larga isso a carta também
toma um café
porque não vens connosco
não devemos demor
não, vão sem mim, já vos disse que prefiro ir a pé, aliás é a melhor parte da noite, que me interessam os assobios dos prostitutos as navalhas nas suas mãos os mercedes a abrandar? Soubessem eles que nem para sexo por dinheiro me recomendo aceleravam. Vou a pé. Como de outra maneira teria tempo para parar à frente de casa de todas as que amei e insultar-me e insultar-me e insultar-me com um ramo do meu cipreste num bolso e um laço das tuas cuecas no outro?
Um dia falei-vos de precipícios e combóios e janelas de terceiros andares. O que não sabem vocês é que no dia seguinte quis atirar-me da ponte sobre o Tejo
- Aha! Agora estão todos em pânico a achar que me vou matar
quis atirar-me da ponte sobre o Tejo
- agora a minha tia liga à minha mãe
atirar-me da ponte sobre o Tejo
- agora o meu pai liga à minha irmã
da ponte sobre o Tejo
- agora a minha irmã abraça-me, a minha mãe finge nada ser, antes a ponte sobre o Tejo que é aqui ao lado, põe o pijaminha e concentra-te
(a minha família ainda acha que sou o mais inteligente)
e no entanto quis atirar-me da ponte sobre o Tejo, sorrindo ver o rio aproximar-se devagarinho muito devagarinho os carros a apitar lá em cima olhar à minha volta: Lisboa é bonita, sempre gostei da vista da ponte à chegada mas do que gostava mais era que o meu pai fosse pela parte vermelha fazia um barulho que acordava a minha irmã eu punha a cabeça de fora da janela olhava para baixo e via verde o rio muita perto pai sentia-lhe o cheiro o vento secando os meus dentes de leite podres do antibiótico: agora tapar o nariz fechar os olhos,
estou quase a mergulhar
seguro o elástico do chapeuzinho
agarro-me aos três palhacinhos
o Matatinho o Tuetinhas a Tarolina,
eles choram de medo, eu canto.
então isto é que é morrer
Ontem vi um anjo na fila de espera das finanças, não percebi se estava ali para abrir actividade se para se fazer explodir. Não percebi se estava ali eu para adivinhar anjos na fila de espera se para arder o resto que de criança em mim repousa - mas para quê tirar bilhete se vamos já tarde demais para as apresentações e para a vida? Terei eu sido o único estúpido a ver Deus no reflexo do saxofone?
De elegias amorosas estamos também fartos, mas só por algumas horas: geralmente as que antecedem o momento em que nos levantamos
- Já venho
saímos de cima dela escorregamos
rolamos para a almofada mais fresca
o tempo necessário na cama para
um ou dois suspiros e a testa secar
o tempo necessário para não aleijar
- Bebé olha que assim me aleijas porra!
o tempo necessário para não dar motivos a ninguém para chorar
- Chora bebé porra
(nunca devias ter tido um filho)
Se não escrevêssemos seria porque não acreditaríamos que num só verso pode caber o
Universo
ou os Dedos dos Pés carentes do mongolóide do acordeão
que cravam convexos a palmilha tinjida das sandálias
o mongolóide curvado suado os ombros felizes
(qual quê, porque digo felizes?)
incompletos
carpindo canções que queríamos compreender.
I feel different with this guitar, I feel really dark
I feel like I'm gonna kill somebody.
I'm gonna kill my momma!
I'm gonna kill your momma!
Mãe?
Não me leves a sério
mas vem buscar-me cá abaixo.
1.5.09
MAIS DISTO DO CÉU
crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise gripe crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise 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crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise crise
28.4.09
Perdoa-me tu que aqui vieste para me ouvir cantar,
mas reparei agora que não presto a justa e herética idolatria ao mitológico deus do rock vai para lá de uma porrada de meses. Liguemos, pois, os cabos do computador às colunas mais potentes de cá de casa, fechemos as portadas e baixemos as cortinas, tiremos o six-pack do congelador, descalcemos os sapatos e espraiemo-nos no sofá num pranto de bebedeira e na mais sublime agonia de cotovelo. É que há quem ainda tenha de comer muita sopa até voltar a pegar numa guitarra em público.
23.4.09
Barba invejável e umbiguismo tolerável,
mas é como diz o outro: construímos arranha-céus e voamos até à lua só para vos levar para a cama.
Só para vos levar para a cama.
Só para vos levar para a cama.
Só para vos levar para a cama.
Só para vos levar para a cama.
20.4.09
A rapariga que compra beringelas em calças de pijama
Porque pode ser que a tal de quem te falo não seja afinal de cá
e que o destino (ai destino, ai) assim o queira
peço-te encarecidamente (para lá de um balúrdio
em advérbios de modo) e de joelhos que
se por destino (ai destino, ai) te encontrares com
a rapariga que compra beringelas em calças de pijama
na rua - dirijo-me a ti porque como sabes
ela é capaz de morar na Luciano Cordeiro
aí pertinho de ti - a interpeles (verbo "interpelar":
relativo a conjunto de pessoas
que não usa protector solar em Agosto
e que se junta no fim das férias para
remover camada epidérmica superficial) numa espécie de
"ó tu
que conheces o joão da faculdade de direito
espera aí"
mas com as tuas palavras
e lhe dês o meu número de telemóvel (0931, por aí fora
ou 707221122 para mandar vir uma cheeseham)
pedindo-lhe que me contacte via sms ou chamada
logo que possa, de modo a
(e isto escusas já de mencionar)
irmos ver o "almoço de 15 de Agosto",
título original (tronco apoiado de lado nas costas da cadeira
braço esquerdo descaído para trás com cigarro preso nos dedos
braço direito empunhando um cálice de branco fresco
face num sorriso lateral contorcido) "pranzo di Ferragosto",
que é simples e bonito
e cheira bem.
Porque pode ser que a tal de quem te falo não seja afinal de cá
e que o destino (ai destino, ai) assim o queira:
que assim como assim
(como quem quer dizer)
assim nos queira,
assim nos queira ter juntado
sabes, casamenteiro,
porque ela é de lá e está afinal cá
e eu estive lá e sou afinal de cá.
(repara, amigo, talvez tenhamos chegado
a uma altura em que uma coincidência,
de tão pouco profunda por ser o que é:
uma coincidência:
nos baste. É que no fim de contas
falamos de amor,
que tem a profundidade de
uma beringela e de
uma coincidência:
e que é sobrevalorizado,
como o é a consciência,
mas que graças a Deus que o é.)
Deixamos voos mais altos para as quintas-feiras
que pode ser que nunca venham,
está bem,
mas até pode ser que sejam já amanhã.
e que o destino (ai destino, ai) assim o queira
peço-te encarecidamente (para lá de um balúrdio
em advérbios de modo) e de joelhos que
se por destino (ai destino, ai) te encontrares com
a rapariga que compra beringelas em calças de pijama
na rua - dirijo-me a ti porque como sabes
ela é capaz de morar na Luciano Cordeiro
aí pertinho de ti - a interpeles (verbo "interpelar":
relativo a conjunto de pessoas
que não usa protector solar em Agosto
e que se junta no fim das férias para
remover camada epidérmica superficial) numa espécie de
"ó tu
que conheces o joão da faculdade de direito
espera aí"
mas com as tuas palavras
e lhe dês o meu número de telemóvel (0931, por aí fora
ou 707221122 para mandar vir uma cheeseham)
pedindo-lhe que me contacte via sms ou chamada
logo que possa, de modo a
(e isto escusas já de mencionar)
irmos ver o "almoço de 15 de Agosto",
título original (tronco apoiado de lado nas costas da cadeira
braço esquerdo descaído para trás com cigarro preso nos dedos
braço direito empunhando um cálice de branco fresco
face num sorriso lateral contorcido) "pranzo di Ferragosto",
que é simples e bonito
e cheira bem.
Porque pode ser que a tal de quem te falo não seja afinal de cá
e que o destino (ai destino, ai) assim o queira:
que assim como assim
(como quem quer dizer)
assim nos queira,
assim nos queira ter juntado
sabes, casamenteiro,
porque ela é de lá e está afinal cá
e eu estive lá e sou afinal de cá.
(repara, amigo, talvez tenhamos chegado
a uma altura em que uma coincidência,
de tão pouco profunda por ser o que é:
uma coincidência:
nos baste. É que no fim de contas
falamos de amor,
que tem a profundidade de
uma beringela e de
uma coincidência:
e que é sobrevalorizado,
como o é a consciência,
mas que graças a Deus que o é.)
Deixamos voos mais altos para as quintas-feiras
que pode ser que nunca venham,
está bem,
mas até pode ser que sejam já amanhã.
6.4.09
Requerimento
A minha vocação é esta
:digitalizar livranças e
conferências de fotocópia acompanhadas
da respectiva procuração;
falo de requerimentos
executivos, percebem-me, pois
a minha tarefa neste metro quadrado
acético
(ascético) é
chupar as poupanças de indivíduos pródigos
como quem chupa
drops de mentol.
- Ao menos tens café à borla - responde
com luzinhas verdes
a máquina fotocopiadora, percebem-me,
como quem nos fotocopia
a alma
em .pdf.
(Ao menos o café à borla,
sinal de que estou vivo
e a caganeira também.)
:digitalizar livranças e
conferências de fotocópia acompanhadas
da respectiva procuração;
falo de requerimentos
executivos, percebem-me, pois
a minha tarefa neste metro quadrado
acético
(ascético) é
chupar as poupanças de indivíduos pródigos
como quem chupa
drops de mentol.
- Ao menos tens café à borla - responde
com luzinhas verdes
a máquina fotocopiadora, percebem-me,
como quem nos fotocopia
a alma
em .pdf.
(Ao menos o café à borla,
sinal de que estou vivo
e a caganeira também.)
18.3.09
E a tua peruca ruiva esquecida na photomaton da estação do cume da serra na avaria do regional para o sul
quando o que ele queria mesmo dizer era que, farto de se olhar de lá do alto, finalmente se decidiu por coser a alma aos pés.
5.3.09
16.2.09
Boa-noite aos corvos
Também, como vós, gosto dos cinzentos. Isto é, percebem-me, também a mim a bruma me embriaga. Não creio que estejam assim tão sozinhos: falamos a mesma língua, sofremos de paixão, comemos chocolates, fugimos com os olhos quando nos apanham a olhá-los, e etc. Dizia: os cinzentos. Parece-vos a vós que só neles, nos cinzentos, só nela, na bruma que embriaga, sentimos inteiro o sangue a pulsar nas artérias
(quais é que são as azuis, as salientes, as dos braços?)
a pulsar nas veias - isto é como quem vos pergunta se a vós vos parece que aquela linha de que vos falei
(não falei? É muito simples: trata-se de uma linha que)
só é realmente perceptível nos cinzentos? Às vezes grossa, cheia, às vezes fina e seca, consoante não sei bem o quê, uma linha a que os dias à nossa volta se parecem quando não usamos relógio no pulso? Pois a mim também. Aborrece-me o concreto: as certezas foram feitas para que as afoguemos em cerveja ou para que as queimemos numa mortalha. Tenho a certeza. E bem reparam que falo das duas mortes mais terríveis que podemos desejar a alguém
(alguém alguma vez desejou a morte a alguém?)
isto é pela água ou pelo fogo. Mas voltando à terra, fiquei com ar de nada quando do nada vos voltei a ver
- Tinha a certeza que te ia encontrar
mas já lá chego. Podia contar-vos das vezes em que ali passo, do mijo que ali faço, das vozes que embaraço quando sinto a cidade adormecer sobre si mesma, esgotada (Lisboa sofre de insónia), puta, e me detenho sobre a montra dos mendigos com ganas de aconchegar uma nota de vinte no edredão de cartão do mais miserável deles, acabando sempre por não o fazer, assinando em vez
VAGABUNDO
no orvalho das portinholas para que me sintas pela manhã. Houvesse ainda corvos nas colinas, nem caridade nem amor seriam necessários. (Já vos disse que o amor é sobrevalorizado?)
Dizia: os cinzentos, gosto deles. Ouvi-vos concordar comigo: não há plenitude na completude de uma cor primária; um constante cinzento anestésico, sem certezas nem relógio de pulso, eis o que nos empurra. Os quase-quase, as traições, os ilusionistas de bairro, as paixões platónicas por correspondência: amo-os a todos com um amor (quase) irrevogável. Que, como creio haver dito, é sobrevalorizado.
Mas esta merda cansa,
nome de rapariga,
e a gente cresce,
e a gente fode
e a gente morre.
Como já deves ter reparado trato-vos por vós, não por tu. Por educação (a minha avó que me veja escrever assim), por pudor, por prazer talvez: pelo amor (quase) incondicional (que cansa) do cinzento. Tal como por amor do cinzento vos ouvi dizer
- Tinha a certeza que te ia encontrar
quando podias muito bem ter dito
- Vem deitar-te na minha cama.
Se nos virmos por aí, convidem-me para dançar. Pode ser que me não desculpe nos meus pés de chumbo (densa afinidade metálica com o pesado coração - que em tempos leve, de latão) e que as voltas dos meus passos não vos vão acordar.
(quais é que são as azuis, as salientes, as dos braços?)
a pulsar nas veias - isto é como quem vos pergunta se a vós vos parece que aquela linha de que vos falei
(não falei? É muito simples: trata-se de uma linha que)
só é realmente perceptível nos cinzentos? Às vezes grossa, cheia, às vezes fina e seca, consoante não sei bem o quê, uma linha a que os dias à nossa volta se parecem quando não usamos relógio no pulso? Pois a mim também. Aborrece-me o concreto: as certezas foram feitas para que as afoguemos em cerveja ou para que as queimemos numa mortalha. Tenho a certeza. E bem reparam que falo das duas mortes mais terríveis que podemos desejar a alguém
(alguém alguma vez desejou a morte a alguém?)
isto é pela água ou pelo fogo. Mas voltando à terra, fiquei com ar de nada quando do nada vos voltei a ver
- Tinha a certeza que te ia encontrar
mas já lá chego. Podia contar-vos das vezes em que ali passo, do mijo que ali faço, das vozes que embaraço quando sinto a cidade adormecer sobre si mesma, esgotada (Lisboa sofre de insónia), puta, e me detenho sobre a montra dos mendigos com ganas de aconchegar uma nota de vinte no edredão de cartão do mais miserável deles, acabando sempre por não o fazer, assinando em vez
VAGABUNDO
no orvalho das portinholas para que me sintas pela manhã. Houvesse ainda corvos nas colinas, nem caridade nem amor seriam necessários. (Já vos disse que o amor é sobrevalorizado?)
Dizia: os cinzentos, gosto deles. Ouvi-vos concordar comigo: não há plenitude na completude de uma cor primária; um constante cinzento anestésico, sem certezas nem relógio de pulso, eis o que nos empurra. Os quase-quase, as traições, os ilusionistas de bairro, as paixões platónicas por correspondência: amo-os a todos com um amor (quase) irrevogável. Que, como creio haver dito, é sobrevalorizado.
Mas esta merda cansa,
nome de rapariga,
e a gente cresce,
e a gente fode
e a gente morre.
Como já deves ter reparado trato-vos por vós, não por tu. Por educação (a minha avó que me veja escrever assim), por pudor, por prazer talvez: pelo amor (quase) incondicional (que cansa) do cinzento. Tal como por amor do cinzento vos ouvi dizer
- Tinha a certeza que te ia encontrar
quando podias muito bem ter dito
- Vem deitar-te na minha cama.
Se nos virmos por aí, convidem-me para dançar. Pode ser que me não desculpe nos meus pés de chumbo (densa afinidade metálica com o pesado coração - que em tempos leve, de latão) e que as voltas dos meus passos não vos vão acordar.
28.1.09
Poesia de frigorífico 2
must men chant beneath their pink repulsive sun as do elaborate boys when rain takes our language apparatus power to sleep?
easy beat over beauty meat
if you fall into winter vision
some fiddle mother mean less by hot
but spray me her thousand honey puppy
delirious peach eternity
yet I drool under your pants
easy beat over beauty meat
if you fall into winter vision
some fiddle mother mean less by hot
but spray me her thousand honey puppy
delirious peach eternity
yet I drool under your pants
25.1.09
Com licença,
Pudera ristrefagiar fora das eltrarias dos luisiames,
singlafinar nos tregombos sungufantes
que ossanfisgam sem julmar, dormicapisando
a pedra que perdera por aí, tudo e tu
numa honomastrufagura júctil imprudente.
Tábua de queijos e enchidos para dois, um cálice de vinho vermelho-vivo e uma faixa retirada do primeiro álbum de originais frutado e encorpado do conjunto liderado por Matt Clusterson, o senhor John MacDahlkins Jr. no vibrafone, um tema seleccionado do aclamado trabalho do quarteto dos subúrbios de Fletcherbroughwitch, proposta robusta ideal para acompanhar carnes vermelhas ou caça. Na próxima meia-hora estaremos à conversa com Tigo Mulher.
E as nuvens lá fora todas nimbus stratocaster.
- O gajo anda a escrever pior.
- Não sei, está mais pretensioso, perdeu toda a piada.
E as nuvens lá fora, a sério, todas nimbus stratocaster. Se escutasses por momentos verias, como nódoas de vinho no vestido verias, as nuvens lá fora todas nimbus stratocaster.
Alegações finais, estancando nos dedos o sangue do nariz,
- Porque me sabes a ferro?
escrevendo chavões a ranho e a giz:
- A tua língua sabe a ferro!
A defesa não tem nada a acrescentar, Meritíssimo.
Ele é mais é esquentadores. Matando por um beijo. Boa noite e um queijo.
singlafinar nos tregombos sungufantes
que ossanfisgam sem julmar, dormicapisando
a pedra que perdera por aí, tudo e tu
numa honomastrufagura júctil imprudente.
Tábua de queijos e enchidos para dois, um cálice de vinho vermelho-vivo e uma faixa retirada do primeiro álbum de originais frutado e encorpado do conjunto liderado por Matt Clusterson, o senhor John MacDahlkins Jr. no vibrafone, um tema seleccionado do aclamado trabalho do quarteto dos subúrbios de Fletcherbroughwitch, proposta robusta ideal para acompanhar carnes vermelhas ou caça. Na próxima meia-hora estaremos à conversa com Tigo Mulher.
E as nuvens lá fora todas nimbus stratocaster.
- O gajo anda a escrever pior.
- Não sei, está mais pretensioso, perdeu toda a piada.
E as nuvens lá fora, a sério, todas nimbus stratocaster. Se escutasses por momentos verias, como nódoas de vinho no vestido verias, as nuvens lá fora todas nimbus stratocaster.
Alegações finais, estancando nos dedos o sangue do nariz,
- Porque me sabes a ferro?
escrevendo chavões a ranho e a giz:
- A tua língua sabe a ferro!
A defesa não tem nada a acrescentar, Meritíssimo.
Ele é mais é esquentadores. Matando por um beijo. Boa noite e um queijo.
27.12.08
Poesia de frigorífico
shine a trip on my skin dream
and think about this purple mist
death whisper on a car crush symphony
a day after your black milk tongue
your sweet summer storm
would bitter the moon
so may they moan together
my sordid chocolate girl
delirious peach eternity
yet I drool under your pants
and think about this purple mist
death whisper on a car crush symphony
a day after your black milk tongue
your sweet summer storm
would bitter the moon
so may they moan together
my sordid chocolate girl
delirious peach eternity
yet I drool under your pants
Instrutor de voo
Três dias após degolarem o anão
pedia o gigante que lhe dessem mais tempo,
a criança de bibe de trazer pela mão
tremia de frio e temia o vento:
- Mamã, serei trolha, de andaime em andaime,
de trato educado e perfil elegante!
- Se comeres as batatas prometo-to, Jaime,
deixar-te assistir a esfolar o gigante.
O piloto, drogado,
o avião despenhado
e a gordura
em pedaços
dos braços
chiando
e o cego, ao Chiado,
nem olhos nem fado
e a candura
em delírios
nos lírios
sangrando.
Comandante Cachaça em lençóis de bossa nova,
engolindo a sua passa ri que morro e me renova
como o ano que se passa como estrela de cinema,
como a asa que estilhaça no meu morro de Ipanema.
pedia o gigante que lhe dessem mais tempo,
a criança de bibe de trazer pela mão
tremia de frio e temia o vento:
- Mamã, serei trolha, de andaime em andaime,
de trato educado e perfil elegante!
- Se comeres as batatas prometo-to, Jaime,
deixar-te assistir a esfolar o gigante.
O piloto, drogado,
o avião despenhado
e a gordura
em pedaços
dos braços
chiando
e o cego, ao Chiado,
nem olhos nem fado
e a candura
em delírios
nos lírios
sangrando.
Comandante Cachaça em lençóis de bossa nova,
engolindo a sua passa ri que morro e me renova
como o ano que se passa como estrela de cinema,
como a asa que estilhaça no meu morro de Ipanema.
19.12.08
Balada do gigante
- Dêem-me um minuto de silêncio
antes de me degolarem - pediu
o gigante aos danados.
- Daqui de cima não me ouço.
antes de me degolarem - pediu
o gigante aos danados.
- Daqui de cima não me ouço.
The White Man (1907)
Lyonel Feininger
10.12.08
Na vasa da mala
Por cada palavra que escrevo um flamingo parte a perna de apoio na lama da savana. Vinte e duas fracturas expostas cor-de-rosa
(que se foda o acordo ortográfico, cor-de-rosa tem mais de corderrosa que de cor de rosa - e quem não é desta-opinião pega-de-empurrão).
Dizia, a cada palavra que escrevo não só a savana perde cor: é o meu filho que de dia para dia mais monocromático, é o sol da minha guitarra que a cada dia mais grave. É como dar um tiro no pé e gabar a pontaria
- Aha! Brutal! O sangue na falange!
ou como ter insónias há três meses e não deixar de beber seis taças de café forte por dia, fora as bicas, que são gomas de chicória inventadas para disfarçar o hálito a beata e tingir os dentes de vida. Tentei guardar os versos para mim, praticar a abstinência e arquivá-los, mas eles eram-me de tal modo medonhos que só esta página, que é página pública e
desquadriculada
desquadricularizada
desquadricularizacionada
desquadricularizacionamentada
desquadricularizacionamentizada
desquadricularizacionamentalizada
desquadricularizacionamentalizacionada
os salvaria do ridículo:
houve tempos em que a banda,
houve livros e o vinho e o amigo feliz
prometendo mais dele que dele
prometesse
e o chocolate que trazia no bolso
para não adormecer,
o chocolate e eu, na
noite branca que a luz escurecera
e enfim mazurcas e valsas
um dois hup,
um dois hup!
e as noites frias a aquecerem
no momento em que tremeste
é muito fácil despir-me,
zufa! sem camisa
zás! braguilha e botão
sem som na palma da mão
e estou de cuecas.
Não ter ninguém que assim me veja porém
é menos triste que não entender o barulho que
a minha alma e braguilha
não fazem mais.
Depois dizem-me que tenho uma filha,
Depois dizem-me que não existo.
Nos meus sonhos assalto bancos, e faço-o com tal brio que jamais sou apanhado: são as sereias dos carros-patrulha a silenciar a cidade e eu fumando um cigarro nas escadas do tribunal
- Foram para ali, senhor guarda!
tranquilo porque o meu melhor amigo baleado nas têmporas não haveria de ser delator. Chegasse o buliço da aurora, desenterraria o saco do dinheiro entre o salgueiro e o jacarandá e voltaria à estrada, que numa casa incendiada já não daria para viver. Se não fodesse tudo à minha volta talvez não precisasse de viajar.
Nas minhas insónias penso em vocês. Menos em ti, que és desinteressante.
Estão convidados para a minha festa. O rendez-vous é amanhã: o mestre faz cem anos, o outro faz vinte e dois.
Denny Crane.
Quase vinte e três.
Denny Crane.
(que se foda o acordo ortográfico, cor-de-rosa tem mais de corderrosa que de cor de rosa - e quem não é desta-opinião pega-de-empurrão).
Dizia, a cada palavra que escrevo não só a savana perde cor: é o meu filho que de dia para dia mais monocromático, é o sol da minha guitarra que a cada dia mais grave. É como dar um tiro no pé e gabar a pontaria
- Aha! Brutal! O sangue na falange!
ou como ter insónias há três meses e não deixar de beber seis taças de café forte por dia, fora as bicas, que são gomas de chicória inventadas para disfarçar o hálito a beata e tingir os dentes de vida. Tentei guardar os versos para mim, praticar a abstinência e arquivá-los, mas eles eram-me de tal modo medonhos que só esta página, que é página pública e
desquadriculada
desquadricularizada
desquadricularizacionada
desquadricularizacionamentada
desquadricularizacionamentizada
desquadricularizacionamentalizada
desquadricularizacionamentalizacionada
os salvaria do ridículo:
houve tempos em que a banda,
houve livros e o vinho e o amigo feliz
prometendo mais dele que dele
prometesse
e o chocolate que trazia no bolso
para não adormecer,
o chocolate e eu, na
noite branca que a luz escurecera
e enfim mazurcas e valsas
um dois hup,
um dois hup!
e as noites frias a aquecerem
no momento em que tremeste
é muito fácil despir-me,
zufa! sem camisa
zás! braguilha e botão
sem som na palma da mão
e estou de cuecas.
Não ter ninguém que assim me veja porém
é menos triste que não entender o barulho que
a minha alma e braguilha
não fazem mais.
Depois dizem-me que tenho uma filha,
Depois dizem-me que não existo.
Nos meus sonhos assalto bancos, e faço-o com tal brio que jamais sou apanhado: são as sereias dos carros-patrulha a silenciar a cidade e eu fumando um cigarro nas escadas do tribunal
- Foram para ali, senhor guarda!
tranquilo porque o meu melhor amigo baleado nas têmporas não haveria de ser delator. Chegasse o buliço da aurora, desenterraria o saco do dinheiro entre o salgueiro e o jacarandá e voltaria à estrada, que numa casa incendiada já não daria para viver. Se não fodesse tudo à minha volta talvez não precisasse de viajar.
Nas minhas insónias penso em vocês. Menos em ti, que és desinteressante.
Estão convidados para a minha festa. O rendez-vous é amanhã: o mestre faz cem anos, o outro faz vinte e dois.
Denny Crane.
Quase vinte e três.
Denny Crane.
30.11.08
Do you really want to hurt me?
«Boy George acusado de algemar prostituto.
O cantor foi acusado de ter espancado o prostituto depois de este se recusar "a ter relações sexuais com ele".»
Dantes eras tu que te encarregavas destas larachas, Bernardino.
O cantor foi acusado de ter espancado o prostituto depois de este se recusar "a ter relações sexuais com ele".»
Dantes eras tu que te encarregavas destas larachas, Bernardino.
29.11.08
25.11.08
Pedi ao carteiro que me lesse em voz alta
Sabes o que é? É o nãoter percebide ainda quea em patia que sen timos
(vourecommeçar, não se escreve deitadona cama, o ombro apoiado na almmofada quando o que queriadizer era o coto velo apoiadonoutrosítio)
Sabes o que é? (sentei-me, ainda na cama, escreve-se melhor)
É o não ter percebido ainda se o que sentimos sou eu só que o sinto. Vamos, tu namoras, por namorar entendo fazer aquelas coisas que fazem os namorados quando juntos; namoras, o que é bom, o que há-de ser bom. Há-de ser algo, há-de SER. Não é nada disso: é só que não percebi (e é isso, sabes, o que é) se o que sentimos sou eu que o sinto só. Era outra coisa, era outra coisa! Era isto, ou qualquer coisa como que isto:
Que a estranha empatia não a sei, se a sinto só
se a empatia em mim só
existe
Não existe.
(la palice é com cê ou dois ésses?)
Esquece tudo, meu amor, acabei de acordar (a língua colada ao céu da boca, as ramelas, o cabelo como a maré-vaza), não estou para ninguém.
Gostava de tentar contigo, um dia
(era isto!)
na sala-de-estar que há-de ser a única divisão da minha casa (um sofá largo e fundo roubado ao camião do lixo, uma mesa redonda, um candeeiro de vidro fosco e uma janela; restos de ontem, colheres e canecas sujas, um maço e um livro e música na grafonola faz-de-conta), tentar contigo um dia
Olhar.
Eu sentava-me aqui, tu sentavas-te à minha frente. Acendíamos cigarros, se quiséssemos; a cafeteira haveria de estar sempre cheia e quente. Punhas-te confortável (descalça os sapatos, tlum! no tapete, ufa-tlum! no tapete e para fora; encolhe as pernas e abraça a almofada velha), eu punha-me confortável também, inventava uma posição que fingisse conhecer (é suposto conhecer o meu próprio sofá, que merda) e olhava-te, assim como tu me olhavas, tal como tínhamos combinado.
Esquecíamos a treta das almas gémeas e o que quer que tivéssemos decidido que devia ou não acontecer. O universo não é dever, é desordem porque é ser, e as almas gémeas são hormonas que se toleram. Tu e eu saberíamos disso - e não perceberíamos um chavo do seu significado. Como te disse:
Tu sentada, eu sentado, olhávamo-nos
(a janela fechada, deixa-a estar, esquece o fumo de cigarro que disfarças não te desnortear, acabará por suspirar e expirar num estalo POP! nos caracóis soltos do teu pescoço. Há dias em que me pareces carregar toneladas; dias em que, sem te tocar, me pesas nos braços)
e isso seria só. Olhávamo-nos, apenas. Não à espera da telepatia, não da palavra, do telefone ou telefonia; nem à espera do correio nem à espera do sorriso. Olhávamos um para o outro até não podermos mais. Até nos doer
(não o frio, não a fome)
existir. Como num jogo: ganhava quem assim conseguisse ficar mais tempo, perdia a quem doesse mais. E como adoras jogos, e como detestas perder,
- Ganhaste, dói-me a cabeça
e pulava para o teu sofá. Fechava os olhos e o corpo, os meus ombros já nas tuas pernas, as tuas mãos despenteando-me o coração. Sem chorar,
(sou lá algum maricas)
seriam lágrimas de fumo a inundar-te o colo.
Esquece a treta das almas gémeas: elas não existem. O que existe, estou certo, é mexeres-me no cabelo sem que te peça; é tremeres a ponta do cigarro porque te pareço menos grotesco assim de perto. Agora sopra o fumo e apaga a beata no muro do coreto
- Anda dançar, esta sabes
no muro do coreto porque não há casa nem restos de ontem. E o que existe, estou certo, é o sol já se ter posto e ainda o ver nas tuas mãos.
O que existe é o que sentimos
se não sei se o sinto só.
(vourecommeçar, não se escreve deitadona cama, o ombro apoiado na almmofada quando o que queriadizer era o coto velo apoiadonoutrosítio)
Sabes o que é? (sentei-me, ainda na cama, escreve-se melhor)
É o não ter percebido ainda se o que sentimos sou eu só que o sinto. Vamos, tu namoras, por namorar entendo fazer aquelas coisas que fazem os namorados quando juntos; namoras, o que é bom, o que há-de ser bom. Há-de ser algo, há-de SER. Não é nada disso: é só que não percebi (e é isso, sabes, o que é) se o que sentimos sou eu que o sinto só. Era outra coisa, era outra coisa! Era isto, ou qualquer coisa como que isto:
Que a estranha empatia não a sei, se a sinto só
se a empatia em mim só
existe
Não existe.
(la palice é com cê ou dois ésses?)
Esquece tudo, meu amor, acabei de acordar (a língua colada ao céu da boca, as ramelas, o cabelo como a maré-vaza), não estou para ninguém.
Gostava de tentar contigo, um dia
(era isto!)
na sala-de-estar que há-de ser a única divisão da minha casa (um sofá largo e fundo roubado ao camião do lixo, uma mesa redonda, um candeeiro de vidro fosco e uma janela; restos de ontem, colheres e canecas sujas, um maço e um livro e música na grafonola faz-de-conta), tentar contigo um dia
Olhar.
Eu sentava-me aqui, tu sentavas-te à minha frente. Acendíamos cigarros, se quiséssemos; a cafeteira haveria de estar sempre cheia e quente. Punhas-te confortável (descalça os sapatos, tlum! no tapete, ufa-tlum! no tapete e para fora; encolhe as pernas e abraça a almofada velha), eu punha-me confortável também, inventava uma posição que fingisse conhecer (é suposto conhecer o meu próprio sofá, que merda) e olhava-te, assim como tu me olhavas, tal como tínhamos combinado.
Esquecíamos a treta das almas gémeas e o que quer que tivéssemos decidido que devia ou não acontecer. O universo não é dever, é desordem porque é ser, e as almas gémeas são hormonas que se toleram. Tu e eu saberíamos disso - e não perceberíamos um chavo do seu significado. Como te disse:
Tu sentada, eu sentado, olhávamo-nos
(a janela fechada, deixa-a estar, esquece o fumo de cigarro que disfarças não te desnortear, acabará por suspirar e expirar num estalo POP! nos caracóis soltos do teu pescoço. Há dias em que me pareces carregar toneladas; dias em que, sem te tocar, me pesas nos braços)
e isso seria só. Olhávamo-nos, apenas. Não à espera da telepatia, não da palavra, do telefone ou telefonia; nem à espera do correio nem à espera do sorriso. Olhávamos um para o outro até não podermos mais. Até nos doer
(não o frio, não a fome)
existir. Como num jogo: ganhava quem assim conseguisse ficar mais tempo, perdia a quem doesse mais. E como adoras jogos, e como detestas perder,
- Ganhaste, dói-me a cabeça
e pulava para o teu sofá. Fechava os olhos e o corpo, os meus ombros já nas tuas pernas, as tuas mãos despenteando-me o coração. Sem chorar,
(sou lá algum maricas)
seriam lágrimas de fumo a inundar-te o colo.
Esquece a treta das almas gémeas: elas não existem. O que existe, estou certo, é mexeres-me no cabelo sem que te peça; é tremeres a ponta do cigarro porque te pareço menos grotesco assim de perto. Agora sopra o fumo e apaga a beata no muro do coreto
- Anda dançar, esta sabes
no muro do coreto porque não há casa nem restos de ontem. E o que existe, estou certo, é o sol já se ter posto e ainda o ver nas tuas mãos.
O que existe é o que sentimos
se não sei se o sinto só.
13.11.08
Todos os mails "FW: Fwd:" fossem assim
«If the global financial crisis continues, by the end of the year only two banks will be operational, the Blood Bank and the Sperm Bank. Then these two banks will merge into a single bank, the "Bloody Fucking Bank".»
9.11.08
7.11.08
6.11.08
A minha máquina de escrever faz parágrafos onde não quero
Vi um louco de veludo
de louco inchado urrando garrett abaixo
- Porcos! escarrando, acho
aos cegos e aos sábios
e à menina do rio,
loiríssima com pinta de actriz
dos olhos pintalgados de lágrimas a verniz
à carne dos lábios
tremendo de frio.
O louco sorriu e à descida
descobriu-lhe uma ferida,
deu murros no peito
e achou-se com vida.
Retrato perfeito, não era ela mais nada
que a boca loiríssima, tímida e escancarada
de um anúncio a perfume
Envy
Desire
Doom!
da paragem do autocarro. Por muito-pouco
não engoliu ela o escarro do louco,
o escarro de perfume
enlouquecido de ciúme,
O cego morto e o sábio rouco.
Desfez sua a trança e não se olhou ao espelho
na fácil confiança de um vestido vermelho.
Mas a verborreia por ali ficara. Apetecia-lhe falar de Lisboa e não conseguia. Fazer uma festa, celebrar não sabia bem o quê. Pisou o cigarro, tomou a sua bica e abalou. Um estudante de Direito não sabe escrever.
de louco inchado urrando garrett abaixo
- Porcos! escarrando, acho
aos cegos e aos sábios
e à menina do rio,
loiríssima com pinta de actriz
dos olhos pintalgados de lágrimas a verniz
à carne dos lábios
tremendo de frio.
O louco sorriu e à descida
descobriu-lhe uma ferida,
deu murros no peito
e achou-se com vida.
Retrato perfeito, não era ela mais nada
que a boca loiríssima, tímida e escancarada
de um anúncio a perfume
Envy
Desire
Doom!
da paragem do autocarro. Por muito-pouco
não engoliu ela o escarro do louco,
o escarro de perfume
enlouquecido de ciúme,
O cego morto e o sábio rouco.
Desfez sua a trança e não se olhou ao espelho
na fácil confiança de um vestido vermelho.
Mas a verborreia por ali ficara. Apetecia-lhe falar de Lisboa e não conseguia. Fazer uma festa, celebrar não sabia bem o quê. Pisou o cigarro, tomou a sua bica e abalou. Um estudante de Direito não sabe escrever.
5.11.08
4.11.08
3.11.08
Queres ir passear o cão para o jardim dos drogados comigo?
Nunca um piqueno poema de um jovem (de quase 22 anos) com a maturidade intelectual de uma pêra-abacate apareceu durante tanto tempo (quase 4 dias) na primeira página de um blogue. Obrigado pelos comentários (quase 1).
31.10.08
De tanto abrir e fechar a janela
Entraram mosquitos
entraram
abelhas, mel e melgas
colaram
Nos teus lábios
de mel e abelhas
Mosquitos
entraram
abelhas, mel e melgas
colaram
Nos teus lábios
de mel e abelhas
Mosquitos
24.10.08
A Justiça contada às crianças
«7. Um "sentido de justiça" inato ou adquirido? Acontecimento e "Origem".
Há quem afirme existir no homem um sentimento inato de justiça, semelhante ao instinto no mundo animal. EHRENZWEIG vai ao ponto de dizer que a natureza foi suficientemente sábia para não confiar no intelecto do homem e por isso dotou este com o "sentido de justiça". Mas também há quem, pelo contrário, afirme que "não é o sentimento jurídico que cria o direito mas o direito que cria o sentimento jurídico" (Rudolf von IHERING). Para muitos autores, o sentimento de justiça tem uma origem histórico-empírica. Não é pois, um sentimento inato. Entretanto, muitos defensores do jusnaturalismo apoiam a tese da existência no homem de um sentimento inato de justiça.
Esta é a velha querela sobre o problema da génese, em tudo semelhante à mesma querela nos domínios da biologia, da psicologia, da sociologia e da linguística: àqueles que defendem o carácter decisivo dos factores endógenos opõem-se os que atribuem esse papel aos factores exógenos.»
Até aqui tudo jóia.
«(...) A questão é, pois, a de saber quais os pressupostos a priori e inquestionáveis de uma certa forma de vida (aquela que se "origina" na "comunidade comunicativa"), e já não a de saber se um desses pressupostos tem a sua génese em factores endógenos ou exógenos. Esta última questão tem a ver com a génese como acontecimento, ao passo que a primeira se não reporta a um acontecimento mas a uma "origem". Ora a "origem" - no sentido em que aqui usamos o termo - não tem nada de comum com uma génese-acontecimento; antes, opera como vórtice ordenador no devir dos acontecimentos e é operando, é na medida em que ordena acontecimentos dispersos e contingentes, que a origem é, ou se torna vigente. Não é, portanto, um acontecimento ou causa explicativa, antes se configura como princípio normativo que só tem vigência ou é - e até só pode vislumbrar-se - porque se cumpre numa ordem efectiva, mas que tem que ser pensado como anterior a essa ordem efectiva.» (numa segunda leitura de Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, J. Baptista Machado)
Pimba! Sentiram? "Valem penus studium sentit cerebrus inflatur", i.e. "vale a pena estudar se se sentir o cérebro inchar".
Imagino Baptista Machado a forrar o seu código civil com Kierkegaard, com medo que lhe berrassem injustamente na rua "ó jurista!", reduzindo-o ao fato e à gravata. O tipo foi um brinca-na-areia jurídico: e este é o mais sincero elogio que lhe posso dar.
Há quem afirme existir no homem um sentimento inato de justiça, semelhante ao instinto no mundo animal. EHRENZWEIG vai ao ponto de dizer que a natureza foi suficientemente sábia para não confiar no intelecto do homem e por isso dotou este com o "sentido de justiça". Mas também há quem, pelo contrário, afirme que "não é o sentimento jurídico que cria o direito mas o direito que cria o sentimento jurídico" (Rudolf von IHERING). Para muitos autores, o sentimento de justiça tem uma origem histórico-empírica. Não é pois, um sentimento inato. Entretanto, muitos defensores do jusnaturalismo apoiam a tese da existência no homem de um sentimento inato de justiça.
Esta é a velha querela sobre o problema da génese, em tudo semelhante à mesma querela nos domínios da biologia, da psicologia, da sociologia e da linguística: àqueles que defendem o carácter decisivo dos factores endógenos opõem-se os que atribuem esse papel aos factores exógenos.»
Até aqui tudo jóia.
«(...) A questão é, pois, a de saber quais os pressupostos a priori e inquestionáveis de uma certa forma de vida (aquela que se "origina" na "comunidade comunicativa"), e já não a de saber se um desses pressupostos tem a sua génese em factores endógenos ou exógenos. Esta última questão tem a ver com a génese como acontecimento, ao passo que a primeira se não reporta a um acontecimento mas a uma "origem". Ora a "origem" - no sentido em que aqui usamos o termo - não tem nada de comum com uma génese-acontecimento; antes, opera como vórtice ordenador no devir dos acontecimentos e é operando, é na medida em que ordena acontecimentos dispersos e contingentes, que a origem é, ou se torna vigente. Não é, portanto, um acontecimento ou causa explicativa, antes se configura como princípio normativo que só tem vigência ou é - e até só pode vislumbrar-se - porque se cumpre numa ordem efectiva, mas que tem que ser pensado como anterior a essa ordem efectiva.» (numa segunda leitura de Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, J. Baptista Machado)
Pimba! Sentiram? "Valem penus studium sentit cerebrus inflatur", i.e. "vale a pena estudar se se sentir o cérebro inchar".
Imagino Baptista Machado a forrar o seu código civil com Kierkegaard, com medo que lhe berrassem injustamente na rua "ó jurista!", reduzindo-o ao fato e à gravata. O tipo foi um brinca-na-areia jurídico: e este é o mais sincero elogio que lhe posso dar.
22.10.08
Esqueçam o rough guide, o michelin ou o american express
e vejam Lisboa. O coração de ouro ao pescoço da holandesa é coisa para ter sido abafada por um sócio da Bica entre duas trincas naquela duchése.
17.10.08
O mocinho e o violão
Começaram por ser palavras sobre as tuas tatuagens,
Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
Pra seguir viagem
Quando a noite vem
chegaram a ser palavras sobre a alvorada de Frei Lourenço e a colheita de Maria Joana que mataria dois adolescentes obtusos e imbecis,
- É, isso é uma revelação incrível da pessoa. E você, que todas as suas letras no feminino são geniais, são impressionantes! Falam que é a anima da pessoa. É bonito, isso. Porque você revela um outro negócio teu, né?, que não é ego, que é do céu, e grande! Tu é lindíssimo. Suas mulheres, essas mulheres de dentro de você são... são lindas!
mas acabaram palavras sobre um sonho mais simples de elegância transparente:
- Lindo! Agora eu que quero cantar!
- Jóia!
Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
Pra seguir viagem
Quando a noite vem
chegaram a ser palavras sobre a alvorada de Frei Lourenço e a colheita de Maria Joana que mataria dois adolescentes obtusos e imbecis,
- É, isso é uma revelação incrível da pessoa. E você, que todas as suas letras no feminino são geniais, são impressionantes! Falam que é a anima da pessoa. É bonito, isso. Porque você revela um outro negócio teu, né?, que não é ego, que é do céu, e grande! Tu é lindíssimo. Suas mulheres, essas mulheres de dentro de você são... são lindas!
mas acabaram palavras sobre um sonho mais simples de elegância transparente:
- Lindo! Agora eu que quero cantar!
- Jóia!
16.10.08
A maturidade da ginginha
Ontem à tardinha, sob o escudo anti-míssil de lençóis desfraldados nos estendais das varandas, inexplicavelmente imunes ao água-vai! sem aviso da rua da Atalaia,
- Grande cadela, meu puto!
era devido que um rapaz de copo meio-vazio em punho se dirigisse com ensaiada sobriedade a grupinhos aparentemente coesos de raparigas e lançasse o seu cavalo de Tróia, cujos guerreiros gregos contavam histórias de flores que caminhavam e de asas de anjo esquecidas em casa. Ontem à tardinha, a breves minutos do ocaso torrado da rua da Rosa,
- Meu maricas!
era devido que uma rapariga de copo meio-cheio, a metade vazia a dar um tom arroxeado ao decote violeta, simulasse aos guerreiros gregos a repulsa de quatro minutos e meio que a livrava da fama de perdida.
Sofistas e filósofos chamavam o Gregório e o Gregório não aparecia. Ano do incêndio do Chiado? 1755. Cognome de D. Dinis? "O agricultor". A procura era elástica, a oferta semi-rígida, a mão invisível no bolso das calças e o ponto de equilíbrio no óptimo de Pareto: o mercado funcionava sem que fossem necessárias injecções de capital ou de soro. Desabituados à teoria das vantagens comparativas, ele e eu cantávamos como estes dois,
o seu copo meio-cheio, o meu meio-vazio,
- Meu maricas!
encontrando o equilíbrio num abraço que fugia para lá de um ano, ebriamente interessados nos sonhos dos outros (os sonhos dos outros sobriamente desinteressados de si próprios).
«Não sou ladrão, eu não sou bom de bola». Talvez esteja mais maduro, talvez apenas mais barbudo: no meu último rali das tascas não roubei nenhuma maçã.
- Grande cadela, meu puto!
era devido que um rapaz de copo meio-vazio em punho se dirigisse com ensaiada sobriedade a grupinhos aparentemente coesos de raparigas e lançasse o seu cavalo de Tróia, cujos guerreiros gregos contavam histórias de flores que caminhavam e de asas de anjo esquecidas em casa. Ontem à tardinha, a breves minutos do ocaso torrado da rua da Rosa,
- Meu maricas!
era devido que uma rapariga de copo meio-cheio, a metade vazia a dar um tom arroxeado ao decote violeta, simulasse aos guerreiros gregos a repulsa de quatro minutos e meio que a livrava da fama de perdida.
Sofistas e filósofos chamavam o Gregório e o Gregório não aparecia. Ano do incêndio do Chiado? 1755. Cognome de D. Dinis? "O agricultor". A procura era elástica, a oferta semi-rígida, a mão invisível no bolso das calças e o ponto de equilíbrio no óptimo de Pareto: o mercado funcionava sem que fossem necessárias injecções de capital ou de soro. Desabituados à teoria das vantagens comparativas, ele e eu cantávamos como estes dois,
o seu copo meio-cheio, o meu meio-vazio,
- Meu maricas!
encontrando o equilíbrio num abraço que fugia para lá de um ano, ebriamente interessados nos sonhos dos outros (os sonhos dos outros sobriamente desinteressados de si próprios).
«Não sou ladrão, eu não sou bom de bola». Talvez esteja mais maduro, talvez apenas mais barbudo: no meu último rali das tascas não roubei nenhuma maçã.
13.10.08
Quase-blogue
«(...) José B. crescera e quase nada tinha mudado. O outro era amigo da família e vinha passar as tardes de sábado no jardim de casa dos seus pais. No escritório onde trabalhava tinha quase mais clientes do que os seus colegas, o que lhe chegava para arrendar um apartamento simpático com quase tantas assoalhadas como o do vizinho. Tinha quase os mesmos amigos que sempre tivera e que, como ele, quase se tinham esquecido das viagens que tinham feito. Ainda bebiam cerveja.
E Deus (em Quem, porque a sua mulher irresistivelmente lhe pedinchara, voltara a acreditar) dava-lhe ainda duas coisas tremendas. E essas duas coisas tremendas, tremendamente incompatíveis, eram o seu filho e uma guitarra eléctrica.» (in O advogado José B. que queria cantar como o Jeff Buckley, 3 de Junho de 2007)
Mais de um ano depois o quase-advogado é ainda um quase-quase: quase a desistir do curso, quase a acabá-lo com notas quase invejáveis; quase a tocar numa banda de baladas-roque, quase a partir a guitarra contra a parede. Quase o quase-advogado percebe que uma menina de olhos muito verdes e cabelos muito loiros que não lhe dê a ele muitos cabelos brancos não é menina para ele. Quase percebe que a única viagem que vale a pena fazer é só de ida - ou quase só de ida. Um ano depois o quase-advogado quase-quase descobre o que quase-quase quer dizer. E com quase os mesmos amigos que sempre tivera quase-quase percebe que vai sendo tarde demais para escrever peças de teatro sobre peças de fruta.
Quase-quase a terminar: o quase-blogue chama-se "o filho e a guitarra" mas esteve quase para se chamar "o filho e a guitarra eléctrica". Porque é que se chama "o filho e a guitarra" e não se chama "o filho e a guitarra eléctrica"? O quase-advogado não sabe. Pode ser que seja do fado que ouvia quando se lembrou do título, pode ser que seja da Grace acústica no seu colo enquanto a Satine eléctrica na cama. Pode ser que seja de ambas as coisas, pode ser que não seja nem de uma coisa nem de outra.
Isto é como o pudim, quer-se instantâneo, sem qualquer pretensão.
Quase instantâneo. Quase sem qualquer pretensão.
Bem-vindos, descalcem os sapatos, há cerveja no frigorífico!
E Deus (em Quem, porque a sua mulher irresistivelmente lhe pedinchara, voltara a acreditar) dava-lhe ainda duas coisas tremendas. E essas duas coisas tremendas, tremendamente incompatíveis, eram o seu filho e uma guitarra eléctrica.» (in O advogado José B. que queria cantar como o Jeff Buckley, 3 de Junho de 2007)
Mais de um ano depois o quase-advogado é ainda um quase-quase: quase a desistir do curso, quase a acabá-lo com notas quase invejáveis; quase a tocar numa banda de baladas-roque, quase a partir a guitarra contra a parede. Quase o quase-advogado percebe que uma menina de olhos muito verdes e cabelos muito loiros que não lhe dê a ele muitos cabelos brancos não é menina para ele. Quase percebe que a única viagem que vale a pena fazer é só de ida - ou quase só de ida. Um ano depois o quase-advogado quase-quase descobre o que quase-quase quer dizer. E com quase os mesmos amigos que sempre tivera quase-quase percebe que vai sendo tarde demais para escrever peças de teatro sobre peças de fruta.
Quase-quase a terminar: o quase-blogue chama-se "o filho e a guitarra" mas esteve quase para se chamar "o filho e a guitarra eléctrica". Porque é que se chama "o filho e a guitarra" e não se chama "o filho e a guitarra eléctrica"? O quase-advogado não sabe. Pode ser que seja do fado que ouvia quando se lembrou do título, pode ser que seja da Grace acústica no seu colo enquanto a Satine eléctrica na cama. Pode ser que seja de ambas as coisas, pode ser que não seja nem de uma coisa nem de outra.
Isto é como o pudim, quer-se instantâneo, sem qualquer pretensão.
Quase instantâneo. Quase sem qualquer pretensão.
Bem-vindos, descalcem os sapatos, há cerveja no frigorífico!
Voar sem collants
Sessão compota
- 28 a caminho de Montauk
- A Navalha
- Açúcar com Chá
- And The Leftovers
- Aquele Caderno Preto
- Avião de Papel
- Criatura
- Dor de crescimento
- É tarde, Maria
- Meia página
- Míssil Supersónico de Destruição
- O Fabuloso Destino de Juli
- O Gattopardo
- O Melhor Amigo
- O Mito do Celofane
- Oportunidade de Carreira
- Palabras sem peruca
- Pudim Royal
- Pés Descalços
- Sim
- Trama
- Vinte e três
- Virado ao Contrário
Compasso a passo
- junho 2010 (1)
- maio 2010 (1)
- março 2010 (2)
- fevereiro 2010 (2)
- outubro 2009 (1)
- setembro 2009 (6)
- junho 2009 (2)
- maio 2009 (2)
- abril 2009 (4)
- março 2009 (2)
- fevereiro 2009 (1)
- janeiro 2009 (3)
- dezembro 2008 (4)
- novembro 2008 (11)
- outubro 2008 (8)